sexta-feira, 20 de setembro de 2013

As lições que vêm da natureza

Hoje, por motivo de força maior, o Márcio Fontão não escreve por aqui. Desse modo, divido com vocês uma de minhas crônicas, publicadas na Revista Dhecore deste mês, na coluna Arquitetando. Forte abraço e boa leitura.

As lições que vêm da natureza
Antonio Luceni
aluceni@hotmail.com

Assisti, certa vez, a uma palestra de um arquiteto que falava sobre cores. Logo de cara, projetou um slide com a imagem de um pássaro lindo, todo colorido, dez, doze cores diferentes, e perguntou: “Querem acertar na escolha das cores em seus projetos? Observem a natureza”.

E coexistiam cores naquele pássaro que, talvez, a maior parte dos arquitetos e designers não utilizaria em seus projetos. Cores vibrantes e intensas, que se relacionavam perfeitamente em suas complementaridades.

Outra vez, entrevistando Ruy Ohtake, ele me alertou: “O arquiteto brasileiro tem medo da cor. O Brasil é um país tropical, mas tem medo da cor; usa a cor timidamente”. Modismos, ausência de identidade própria, ou ainda repetição de padrões europeus ou norte-americanos como forma de “ser chique”; isso e mais um pouco desviam arquitetos, designers e paisagistas brasileiros de uma arte mais nossa, de um projetar mais tupiniquim.

Só que o Brasil “está na moda”! É hora de rever conceitos. O mundo está nos paparicando.

A bola da vez, em arquitetura, são as construções sustentáveis. É um tipo de discurso que, saindo do discurso, irá fazer muito bem para todos nós. E aí está algo que é contraditório na arquitetura contemporânea: atender ao individualismo e ao narcisismo exacerbado e, ao mesmo tempo, beneficiar um todo social. Como fazer com que os projetos, ainda que pessoais, façam bem para coletividade? Que, mesmo atendendo a questões de “personalizações”, de “bem exclusivo”, ainda assim deixem um saldo positivo para os que não têm acesso a ele? Talvez uma das respostas seja mesmo a sustentabilidade. O não agredir tanto à natureza, o facilitar a circulação de pedestres, o ir e vir etc. constitui-se em grande ajuda.

Os índios nos ensinam isso há séculos, mesmo antes de aportarmos por aqui. Construções para uso coletivo, sem “suítes martes”, sem “espaços gourmets”, sem “platôs”, piscinas particulares e tantos outros componentes-símbolo de ostentação e segregação. Dormem em redes, conversando e rindo até que todos peguem no sono. Comem num grande círculo, com alimentos cultivados, colhidos e preparados por eles próprios; o dividir do pão é algo sagrado e não se limita a um fastfood, com horários corridos e desencontros familiares. Banham-se em rios e cachoeiras e, sobre vales e chapadões, miram o mundo no final do dia, encerrado com um pôr do sol.

Olhemos os lírios dos campos, observemos o joão-de-barro... quão harmoniosas e eficazes são suas edificações. E os condomínios construídos por abelhas e maribondos? As formas escolhidas, as simetrias multiplicadas, formam rendas arquitetônicas de causar inveja a muitos construtores.

Calatrava se inspira na natureza. Gaudí se inspirou na natureza. Niemeyer encheu de natureza as curvas de suas edificações.

Antonio Luceni é mestre em Letras, jornalista e escritor. Graduando em Arquitetura e Urbanismo e pós-graduando em Arquitetura e Cidade.

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