Eu estava preparada para iniciar com vocês uma
conversa sobre a música, suas técnicas e possibilidades, quando lembrei que
domingo é o Dia das Mães. Puxa! Não poderia perder a chance de relatar a vocês,
especialmente às mamães, uma experiência musical que aconteceu em nossa família
quando eu estava grávida da Tayná, nossa primogênita.
Todas as noites, meu marido cantava para minha
barriga a mesma “musiquinha”. É uma música muito cantada para as crianças,
especialmente nas igrejas. A música compara uma menininha como uma florzinha
que canta.
Bem, eu achava esquisito meu marido “cantar para
minha barriga”; na minha ignorante concepção – embora meu bebê já nos ouvisse –
não acreditava que ele poderia entender o que seu pai estava fazendo. Quando
eu, constrangida com a cena o indagava, ele dizia sorrindo, para eu dar
licença, pois estava cantando para sua filha. Era para mim, mesmo sendo a
musicista da família, algo estranho cantar para uma barriga, mas eu tentava não
interromper aquela serenata e as conversas que a seguiam. Embora me sentisse
envergonhada com aquela situação, talvez por minha imaturidade, pouca idade, no
auge dos meus 20 aninhos... sei lá.
Quando minha filha nasceu foi uma alegria só. Aí
estava a nossa “florzinha”. Após uns seis meses, mais ou menos, um dia, a
professora que cuidava das crianças na igreja que frequentávamos me perguntou
se costumávamos cantar para a Tayná. Eu disse que não era o costume, mas
curiosa perguntei o porquê. A professora, eufórica, me disse que em uma
determinada música a Tayná ficava muito feliz, balançava os bracinhos e sorria
muito, tentando acompanhar a dinâmica da sala enquanto as demais crianças a
entoavam. Pois é, era exatamente a mesma música que meu marido todas as noites
cantava para sua florzinha plantada em minha barriga. Relacionamentos...
Reconhecimento... Identidade... Comunicação... Amor!
Muito mais que sons, que linhas melódicas, a
música servindo de esteio para o estabelecimento emocional de um ser humano. A
música como fio condutor de identificação, dizendo quem ele é, que ele é amado,
bem-vindo, que tem “o seu” um lugar entre nós.
A música faz parte do nosso meio mais
intensamente do que podemos compreender e detectar. Ela embala as mais ricas
experiências e, realmente, serve de trilha sonora para histórias maravilhosas,
sendo capaz de estabelecer laços, trazendo comunicação onde as palavras não
conseguem fazê-lo. Está conosco desde antes do nosso nascimento com lembranças
dos sons produzidos pelos órgãos de nossa mãe e pelos seus batimentos cardíacos.
Mostram ao bebê que ele faz parte de algo, tem identidade, é pertencente geográfica
e afetivamente a um povo.
A poetisa Africana Tolba Phanem retrata em seu
texto “Nossa Própria Canção”, também conhecido como “Canção dos Homens”, um
mito que diz sobre a importância de se dar as pessoas uma identidade, dar honra
e amor desde a concepção. O respeito que há quando reconhecemos o outro como o
único dono de sua história, de “Sua Canção”.
Todos nós temos a nossa música essencial; aquela
que, ao ser tocada, faz com que as pessoas nos reconheçam nela, pois relata
nossa essência. E você, reconhece no meio de tantos sons a sua música? A sua
história, a sua essência?
Link para canção: http://www.youtube.com/watch?v=5D9ZOaOArj0
Link para canção: http://www.youtube.com/watch?v=5D9ZOaOArj0
Neila Fontão é formada em Canto Lírico pelo Conservatório Dramático e Musical de Tatuí "Dr. Carlos de Campos". Pianista e regente do CantAta Coral e educadora musical do Projeto Guri.
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