domingo, 10 de junho de 2012

Divagação sobre o ato de escrever


Antonio Luceni
aluceni@hotmail.com

Escrever é um ato de solidariedade. Talvez seja esta a resposta. Talvez seja este o combustível que alimenta minha produção.
Não poucas vezes me perguntei sobre o porquê de eu escrever. Também não poucas foram as tentativas de parar de escrever; achava (e às vezes isso ainda acontece) que não estava trazendo nenhuma contribuição com o textos que produzo, com as palavras que deixo registradas no papel. Talvez fosse um desperdício de árvores, talvez fosse uma forma de engodo, de irresponsabilidade seduzir alguém para alguns parágrafos que, no final, não lhe acrescentar nada.
O exercício de escrever é, por vezes, ingrato. Obrigatoriamente faz com que a gente se isole, mergulhe por um tempo em pensamentos e questões que, em tese, só interessam a nós mesmos, estritamente a quem se põe a escrever. Depois, quando as palavras lançadas ganham corpo e forma, quando achamos que estão prontas para andar sozinhas, as encaminhamos para um editor de jornal, blog ou para alguma editora que as continue conduzindo para (sabe Deus) os mais diferentes caminhos. Agora, com os vários portais na internet, até longos caminhos, outros países, e por aí adiante...
Mas, de novo, as questões e dúvidas sobre o peso que as palavras têm, sobre as contribuições dadas ou não pela nossa escrita. De fato, há escritores muito mais interessantes que eu, há muitas outras narrativas que valem muito mais atenção que as que escrevo, há construções sintáticas e linguísticas, há temas e reflexões muito mais salutares que as minhas... então, prezado leitor, sugiro que abandone imediatamente este texto e vá em busca delas, de autores infinitamente mais significativos que eu.
Agora, livre do peso da responsabilidade de prender quem quer que seja nestas linhas vãs, coloco-me, de fato, ao meu ofício de escrever. Ou seja, escrevo para um deleite pessoal; escrevo porque, assim como Van Gogh e Portinari não podiam deixar de pintar, assim como Gaudí não deixou um só minuto de pensar num mundo em que a natureza construída se relacionava com a natureza natural e estas diretamente com o homem, como Frank Sinatra não podia deixar de cantar um só dia, escrevo para me fazer perceber neste mundo, para me fazer existir, ainda que com pensamentos rasos, com crenças e certezas fluidas, diluídas por cada experiência com a qual entro em contato, com singelezas que me fazem mudar de ideia.
Escrevo porque preciso dividir, apesar do pouco que tenho, minhas ideias com meus irmãos, porque na comunhão de pensamentos, busco um caminho melhor para suportar e pensar este mundo, para expor minhas limitações e, quem sabe, fazer com que alguém se identifique com elas e, tal qual a mim, não se sinta só em suas fragilidades, fraquezas...

Antonio Luceni é mestre em Letras e escritor. Membro e Diretor de Integração Nacional da União Brasileira de Escritores – UBE.

2 comentários:

  1. Me fizeste lembrar de um poema de Antonio Cícero:
    Guardar

    " Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
    Em cofre fechado não se guarda nada.
    Em cofre perde-se a coisa à vista.
    Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la,
    mirá-la por admirá-la, isto é,
    iluminá-la ou ser por ela iluminado.

    Guardar uma coisa é vigiá-la,
    isto é, fazer vigília por ela,
    isto é, estar acordado por ela,
    isto é, estar por ela ou ser por ela.

    Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro,
    do que um pássaro sem vôos.
    Por isso se escreve, por isso se publica,
    por isso se declama e se declara um poema:
    para que ele, por sua vez, guarde o que guarda,
    guarde o que quer que guarde um poema.
    Por isso o lance do poema:
    por guardar-se o que se quer guardar. "

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  2. Lindo poema, Rafael... dialoga perfeitamente com o sentimento do que escrevi. Obrigado por acompanhar.

    Abraços cordiais,

    Antonio

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