Dia de trabalho?
Antonio Luceni
aluceni@hotmail.com
“E, havendo
Deus terminado no sétimo dia a sua obra, que fizera, descansou nesse dia...” –
Gênesis 2.2a
Eu e meus
irmãos começamos a trabalhar desde muito cedo. Com meus pais também foi assim.
Não ouvi história diferente sobre meus avós. É verdade que, se tivéssemos
opção, isso seria protelado. É muito difícil ter que, ainda criança ou
adolescente, levar nas costas o peso da responsabilidade de uma casa: comida,
vestimenta, água, luz, produtos de higiene e limpeza e, ainda por cima, sobrar
algum tempo para diversão, estudo etc...
Meus avós – e
sempre me refiro aos maternos porque foi com quem sempre tivemos mais contato –
ajudavam seus pais na roça, colhendo algodão, tomate, quiabo, milho...,
ajudando a carpir e a retirar matos das plantações, arrancando tocos ou
espinhos do meio do caminho, erguendo taperas para se recolherem à noite,
passando maus e difíceis bocados para conseguir o básico e continuar com a
morte e vida severina que lhes eram imposta.
Minha mãe,
filha mais velha de uma prole de dez, acabou assumindo o lugar de dona de casa,
isso já com dez, doze anos. Lavava, passava, cozinhava, arrumava a casa,
cuidava dos irmãos mais novos, servia aos pais. Até hoje, alguns de meus tios
pedem “benção” pra ela quando chegam à casa dela.
O Lúcio –
coitadinho de meu irmão – carregava enormes latas d’água de uma distância
horrível até em casa, sobre os ombros ou na cabeça, para abastecer potes de
barro que serviam como reserva para matar a sede, lavar louças, fazer comida e
tudo o mais. E ele só tinha seis ou sete anos nesta época, no interior do
Ceará.
O Lindomar e o
Lucivan também passaram por um caminho parecido. Menos duro que nosso irmão
mais velho, pelo que sabemos e imaginamos, mas igualmente cruel. Roças de
tomate, canaviais com cascavéis, escorpiões, foligens e esse sol quente de
nossa região que não perdoa ninguém. Tudo isso saindo de madrugada, com uma marmita
tão precária que, muitas vezes, se tinha que buscar uma abobrinha, um tomate,
maxixe ou coisa do gênero para completar a refeição.
Eu e a Lindalva
não sofremos tantas agruras como as descritas. Ela porque era a única menina da
casa; eu porque nunca tive tanta vocação para este lado mais pesado do
trabalho, nunca tive muita saúde pra enfrentar sol, chuva ou frio. Mas comecei
cedo também. Frequentei a Fundação Mirim, depois o CEFAM e por aí iniciei minha
carreira profissional que, como a vocação mostrava, restringiu-se até os dias
de hoje ao Magistério.
Neste dia do
trabalho recordamos, não com tanta alegria, é verdade, sobre o percurso pelo
qual passamos para conseguir o pão e viver honestamente nesta terra, apesar de
continuarem a querer nosso sangue, pele e ossos com tantos impostos, juros e
roubalheiras mais fiscais.
Mas se até Deus
descansou após um longo trabalho, por que nós não estaríamos fazendo o que de
melhor se deve fazer depois de tanto trabalhar? Descansar.
Antonio Luceni é mestre em Letras
e escritor. Membro e Diretor de Integração Nacional da União Brasileira de
Escritores – UBE.
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