domingo, 1 de maio de 2011

Príncipes e princesas, sapos e lagartixas


Antonio Luceni
aluceni@hotmail.com

Gostaria de iniciar nossa reflexão desta semana perguntando o seguinte: Ainda há espaço em nossa sociedade contemporânea para príncipes e princesas? Se a resposta for “sim”, qual espaço seria? E se for “não”, muito bem, começamos a dialogar.
A sociedade, desde sua formação, é desigual. Quando o homem começa a se organizar em cidades a coisa já começa a degringolar. As classes sociais surgem com toda força e não é preciso ser marxcista para saber o final dessa história: vai ter gente demais carregando gente demenos nas costas.
Claro que todos gostamos de andar bem vestidos, comer em restaurante fino, beber um bom vinho, ar-condicionado, câmbio automático, especial cinco estrelas, entre tantas outras regalias que até parecemos rei (ou seria príncipe?!). Mas até onde vai a conveniência individual em detrimento da subsistência coletiva? Coisa pra se pensar, não é mesmo?
Já pensou se todos quiséssemos (e conseguíssemos) 3 ou 4 carros com tantos cavalos quantos fossem possíveis? Você já parou para imaginar quantos planetas seriam necessários para que todos tivéssemos duas ou três casas (de campo, de praia, urbana etc...)? A Terra não seria uma espécie de “queijo suíço” necessário fosse fazer coroas, colares, pulseiras, anéis e tornozeleiras pra todos do planeta? Vamos parar por aqui? Os exemplos são suficientes, não é mesmo?
Outro dia estava conversando com uma amiga exatamente sobre isso. Não sei se porque já passei por privacidades mil – às vezes não tinha nem o dinheiro da condução para voltar do trabalho, comi arroz branco (juntamente com meus irmãos) para poder ter uma geladeira em casa, entre tantas outras coisas que só quem passa pra entender – que determinadas coisas ferem a minha percepção de mundo.
Por exemplo: comprar uma bolsa de 5 ou 10 mil reais só porque há umas letrinhas nela, tal qual a visão distorcida de um bêbado que vê as coisas multiplicadas, não entra em minha cabeça. Tantas outras bolsas, com igual ou superior qualidade, cumprem o mesmo papel que a “de marca” e que, em seu devido valor de uso, não fere nenhum ser humano. (Já pensou quantos poderiam ser estudados com o troco “da de marca”?).
Outro exemplo: um cidadão que tem 4, 5 ou 6 casas. Você acha que realmente ele tem tempo para usufruir de cada uma delas como deveria? Será que somente uma, bem equipada, bem cuidada etc., não seria suficiente para prover-lhe o que de necessário precisa para manter-se com dignidade no mundo e, com o excedente, abençoar outras pessoas.
(Nessa altura tenho certeza de que alguns já estão rindo de mim ou até mesmo encerraram a leitura em linhas anteriores. Não há problema. Se não me ouvirem, tal qual fez Vieira, falo para os peixes, para as paredes, para as pedras, para quem quiser me ouvir).
Talvez tudo isso possa parecer uma loucura. Talvez de fato ter dois ou três vestidos extras, fazer dois ou três bolos (mesmo que um deles seja desperdiçado), encomendar véus e grinaldas com diamantes, safiras e outras pedras preciosas (mesmo que tenham custado a vida de muitos em guerra civil ou minas insalubres) seja mesmo um luxo! Talvez, aparecer e colocar-se como um “símbolo ideal” e viável seja mesmo um mundo possível.
Eu ainda fico com os contos de fadas. Neles, o luxo e ostentação de príncipes e princesas, reis e rainhas não fazem mal para seus súditos. Afinal, tudo é do mundo-do-faz-de-conta. Pra nós, sapos e lagartixas, fica o mundo-do-paga-a-conta.

Antonio Luceni é mestre em Letras e escritor. Diretor de Integração Regional/São Paulo/Noroeste da União Brasileira de Escritores – UBE.

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